Comunidades de baixada, favelas de baixada, ou simplesmente baixadas, são territórios populares com baixa elevação vertical relativa ao ponto de drenagem mais próximo; e, portanto, situados em áreas alagadas ou suscetíveis a inundações, caracterizados pela insuficiência de equipamentos urbanos e infraestruturas, e ocupados historicamente por populações em condições de vulnerabilidade socioeconômica e ambiental.
É importante entender que há uma diferença entre a baixada geográfica, e a baixada popular e política, uma vez que nem todos que vivem em um terreno mais baixo possuem característica de populações vulnerabilizadas. No Observatório das Baixadas, nós entendemos que as Baixadas são as regiões que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) compreende como Comunidades Urbanas e Favelas situadas em regiões de baixada geográfica, vulneráveis aos eventos climáticos extremos relacionados a água, em suas diversas formas.
Pensar nas Baixadas é essencial devido à sua extrema vulnerabilidade a eventos climáticos extremos, como enchentes e inundações, que afetam desproporcionalmente essas áreas. Essas comunidades, muitas vezes situadas em locais baixos e próximos a corpos d’água, enfrentam alto risco com o aumento do nível do mar e as mudanças climáticas. Além disso, as Baixadas brasileiras são territórios onde o impacto ambiental se cruza com desigualdades sociais, exigindo estratégias de adaptação e justiça climática que reconheçam e fortaleçam o papel das populações locais, especialmente os jovens das periferias, na proposição de soluções
Entre 1991 e 2023, o Brasil registrou um aumento expressivo nos desastres
relacionados a chuvas intensas, enxurradas e alagamentos representando quase metade das ocorrências, além de representarem o tipo de desastre que mais afeta a população brasileira, passando dos 70% dos registros.
Estima-se que, até 2050, mais de 30% dos municípios brasileiros estarão em risco extremamente elevado de desastres geo-hidrológicos, principalmente nas baixadas. Essas áreas abrigam milhões de pessoas que convivem diariamente com ameaças climáticas, tornando-se urgente a implementação de políticas públicas eficazes e planos específicos de adaptação para minimizar os impactos e proteger essas populações vulneráveis. Segundo o relatório mais recente do IPCC (2022), a América do Sul e Central são mais afetada por desastres hidrológicos do que por outros tipos de desastres, e a tendência é que os registros aumentem nas próximas décadas. Segundo o MCTI, até 2050, 30,82% dos municípios brasileiros podem ser classificados com risco “Muito alto” ou “Alto” para esse tipo de desastre (Imagem 2).
O Atlas das Baixadas é uma ferramenta desenvolvida a partir de dados públicos disponibilizados pelo poder público, com o objetivo de localizar essas comunidades de baixada no Brasil. Dessa forma, é possível entendermos quem são aquelas pessoas que são impactadas frequentemente, ou que possuem risco e vulnerabilidade maior aos desastres climáticos e ambientais que acometem as baixadas do Brasil. Assim, é possível desenhar melhores estratégias de adaptação climática e prevenção de riscos de desastres.
METODOLOGIA:
O atlas cruza basicamente dois bancos de dados geoespaciais: (1) Os dados para Favelas/ Comunidades Urbanas do IBGE (2019) e o dados para regiões suscetíveis a inundações da Agência Nacional de Águas (ANA) e do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH), de 2021.
Antes de 2023, as comunidades vulnerabilizadas brasileiras eram reconhecidas pelo IBGE como “Aglomerados Subnormais”, termo de forte conotação pejorativa para nossa população. Para o Censo de 2022, entretanto, o órgão realizou uma revisão que substituiu o termo por “favelas e comunidades urbanas”, alinhando-se com direitos de moradia e cidade previstos na Constituição (1988) e no Estatuto da Cidade (Lei 10.257 de 10 de julho de 2001). A metodologia considera áreas com ocupação irregular ou desordenada, carentes de serviços públicos essenciais e com deficiências estruturais, inspirando-se em conceitos internacionais, como o de “slums” da ONU-Habitat. Assim, favelas e comunidades urbanas são mapeadas considerando variáveis como acesso a água, saneamento, estrutura habitacional e segurança de posse, buscando identificar áreas com condições precárias de habitação.
A ANA e o IPH realizam um projeto colaborativo desde 2019 para a cooperação em tecnologias para análises hidrológicas em escala nacional, sendo um dos produtos dessa colaboração o desenvolvimento de um banco de dados de mapeamento de áreas inundadas usando a metodologia HAND, do inglês Height Above Nearest Drainage, ou em português: Altura acima da drenagem mais próxima. O HAND é uma forma de representar o terreno que ajusta a topografia com base na altura de cada ponto em relação à rede de rios e canais próximos. Esse modelo ajuda a entender como a água pode escoar e acumular em diferentes partes do solo. Em resumo, cada ponto do mapa mostra quantos metros ele está acima da drenagem mais próxima, ajudando a identificar áreas com diferentes potenciais de drenagem e retenção de água no solo, e consequentemente as áreas suscetíveis a inundações em diferentes níveis de impacto.
Os dados foram utilizados em formato de texto e geodado raster e vetor, os quais passaram por geoprocessamento através do software Qgis, e posteriormente vinculados à plataforma digital de demonstração geoespacial Mapbox. Devido a alta complexidade de se processar os dados, a primeira versão do atlas foca nas capitais brasileiras e suas regiões imediatas.
Contribuir com o Atlas é uma forma de acelerar o processo de estruturação dos dados necessários para se pensar as melhores estratégias de adaptação para as cidades brasileiras e suas comunidades/favelas de baixada.
Além disso, os dados atuais demonstram certas inconsistências quando expostos à perspectiva popular. Um exemplo disso, é que na cidade de Belém do Pará há regiões consideradas pelo IBGE como Comunidades Urbanas/Favelas, e que não são reconhecidas como tais pela população (Imagem 3). Da mesma forma, existem regiões na cidade que são consideradas como comunidades urbanas/baixadas pela população, mas que são desconsideradas pelo Instituto (Imagem 4). Na região metropolitana de Belém, 80.61% das comunidades estão situadas em regiões de altíssima vulnerabilidade a eventos climáticos e ambientais extremos relacionados à água.
Outra discussão, de muitas a serem desenvolvidas por meio de facilitação do Observatório, é o fato de algumas cidades terem uma delimitação política para a Baixada que pode não abranger todas as baixadas, caso da região metropolitana do Rio de Janeiro. Nesta região, há a Baixada Fluminense, a qual muitas vezes é delimitada desconsiderando a capital do estado, porém os dados demonstram que há um número considerável de favelas na cidade do Rio de Janeiro em condição de Baixada, mais especificamente 57,11% das favelas estão em condição de baixada. (Imagem 5)
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